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Fethullah Gülen: “Erdogan vai acabar como Hitler e Estalina”

Fethullah Gülen: “Erdogan vai acabar como Hitler e Estalina”

O pregador Fethullah Gülen foi em tempos um aliado próximo do presidente turco. Hoje, Erdogan acusa-lo de estar por trás da tentativa de golpe de julho de 2016, e Gülen está exilado. Nesta entrevista, ele explica as fraquezas do presidente turco.

Fethullah Gülen, inimigo número 1 do estado turco, vive há vários anos nos EUA. O encontro com ele deu-se em sua casa na Pensilvânia, sob proteção policial.

A saúde do homem de 78 anos, que o governo turco vê como uma ameaça, é frágil. Ankara exigiu, em vão, a sua extradição dos Estados Unidos. Ankara acusa o pregador, afirmando que ele e o Movimento Hizmet estão por trás do golpe de estado falhado de julho de 2016, o que Gülen negou consistentemente.

Ele testemunha impotente a maneira como os seus apoiantes são perseguidos, até em corredores da ONU. O governo turco tem feito de tudo para retirar as suas acreditações das ONGs dirigidas por apoiantes de Gulen. Não terão um dizer quando a sessão da Revisão Periódica Universal (RPU), dedicada à situação na Turquia, for realizada em frente ao Conselho dos Direitos Humanos da ONU em Geneva.

Welt: Porque é que Erdogan o odeia tanto? Foi seu aliado no passado, não foi?

Fethullah Gülen: O Movimento Hizmet nunca teve uma relação próxima com ele. Erdogan parecia partilhar as nossas ideias de democracia. Só isso. Ele lutava pelas mesmas coisas. Mas quando assumiu o poder, mostrou um lado completamente diferente. Não podia apoiar isso. As nossas escolas defendem uma visão de educação incompatível com a tendência ao autoritarismo. Defendemos, por exemplo, o direito dos cidadãos curdos usarem a sua língua a par com a língua turca. É ele que me considera seu inimigo. Nunca o considerei como tal.

Só lhe pedi que cumprisse as suas promessas. O seu maior inimigo é ele mesmo. Ele vê-se como o humano mais inteligente do mundo mas, na realidade, é movido por sentimentos de ciúme, ódio e vingança. O seu governo afundou-se em paranóia. A minha irmã mais velha tem de viver escondida e todos os que têm o mesmo apelido que eu são presos.

Welt: Então a vossa discordância vem da questão dos curdos, se bem percebemos?

Fethullah Gülen: Erdogan não está em sintonia comigo. Quando era primeiro ministro, o ex-presidente Turgut Ozal resolveu parcialmente o problema ao incluir ministros curdos no seu gabinete, assim como sociais democratas e representativas de outras correntes políticas. Eu acredito que deverá ser garantida mais liberdade e que a língua curda deve ser permitida nas escolas. Isto requer um estado mais descentralizado. Se um dia houver uma nova reforma constitucional, recomendo-lhes que estudem o modelo da constituição americana, que garante grande liberdade aos cidadãos.

Welt: Qual é a sua abordagem de oposição em relação à liberdade? Erdogan acredita que as mulheres pertencem à cozinha. Isso também será uma razão do seu desacordo?

Fethullah Gülen: (Sorri.) Pessoalmente não sou a favor do modelo patriarcal, porque é um passo para trás na história do começo do Islão. As mulheres devem ser capazes de encontrar o seu lugar na sociedade em todo o lado. Se uma mulher quiser ser juíza ou piloto, nada deve pará-la.

Welt: Erdogan também se esforça para desempenhar um papel no cenário internacional e regional. O que pensa da operação militar lançada por Erdogan na Síria em 2019?

Fethullah Gülen:Era uma operação de desvio. Ele queria desviar a atenção das pessoas para que não se focassem nos problemas internos da Turquia. Era também uma nova oportunidade para posar como um homem forte no mundo muçulmano. Mas podemos ver o resultado na Síria. Ele tornou-se num assassino ao apoiar uma revolta irrealista. Tem grande responsabilidade em tudo o que aconteceu. Milhares de mortos, milhões de refugiados, todas estas coisas horríveis. Um dos seus ex-ministros perguntou-me qual era a solução para sair a crise Síria. Eu respondi que seria necessário um acordo para se avançar rumo à democracia, passo a passo.

Eu disse que é importante apoiar um processo de democratização gradual na Síria e, se necessário, ajudar Assad a permanecer presidente durante algum tempo, assegurando que todos os grupos étnicos, quer sejam uma maioria ou minoria, estejam no parlamento e sejam representados. Mas eles ignoraram o meu conselho.

Welt: Influenciar a situação na Líbia também é um erro de Erdogan?

Fethullah Gülen:Sempre houve tensão entre as diferentes regiões na Líbia. Mais uma vez, Erdogan desempenha um papel negativo ao apoiar certos grupos. Ele quer ser o novo líder do mundo muçulmano, mas como pode ele reivindicar tal posição enquanto apoia e encoraja ações que levam a conflitos entre sunitas? Está preso pelas próprias contradições. Todos os ditadores e tiranos narcisistas como Hitler e Estalina tiveram um mau final. O seu reino sempre acabou em fúria. Ele sofrerá o mesmo destino.

Welt: Por enquanto, Erdogan continua a exercer pressão no oriente ao ameaçar sair da NATO. Acha que ele faria mesmo isso?

Erdogan parece estar a tentar aproximar-se da Rússia e da Organização para Cooperação de Shanghai, para uma colaboração, mas é só bluff. Na verdade, está apenas a tentar fazer chantagem. Ele não consegue deixar o oriente. Precisa deles para se proteger. Ele utiliza esta retórica para convencer os seus apoiantes. Pessoalmente, acredito que a Turquia deva manter as suas relações com a NATO e a Europa.

Welt: De qualquer maneira, a questão da adesão da Turquia à UE parece estar definitivamente fora de questão. Arrepende-se disso?

Fethullah Gülen: Atualmente, com o seu governo totalitário não vejo como será possível tornarem-se membros da União Europeia. Não há nada a esperar de pessoas que se mantêm no poder através de violência, ódio e vingança. Aos olhos da França e da Alemanha, a Turquia perdeu toda a credibilidade por agora. O nosso movimento defenderá sempre a reaproximação à União Europeia porque podemos aprender e beneficiar da mesma.

Welt: Erdogan parece mais inclinado a abordar a Irmandade Muçulmana. O que acha disto?

Fethullah Gülen: Ele é maquiavélico. Se se tornou próximo dos irmãos Muçulmanos, foi por calculismo. Se perderem influência, ele irá deixá-los rapidamente.

Welt: Como prevê o futuro papel do seu movimento?

Fethullah Gülen: Hizmet irá continuar a ser uma fundação humanitária porque essa é a sua vocação primária.

Infelizmente, isto é tornado difícil pelo contexto desfavorável. Somos um movimento muito pequeno, mas continuaremos a defender o nosso modelo de harmonia social e respeito mútuo, tolerância e diversidade. Creio que os valores humanistas podem unir-nos além das nossas afiliações religiosas.

Recentemente, fui tratado num centro hospitalar. Conheci doutores cristãos e judeus lá, que tratavam de pacientes muçulmanos com grande respeito. Fiquei tocado pela sua humanidade. Deus avalia as pessoas pelas suas ações, não pela sua aparência.

Entrevista por Alain Jourdan publicada a 24 de janeiro, 2020/ The Welt+

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